domingo, 28 de dezembro de 2008

Família Matarazzo é investigada por mortes


Depois de assistir à ruína de um império que já somou 365 empresas e que hoje acumula dívidas de R$ 200 milhões, a família Matarazzo presenciou apaticamente o desmanche do palacete da avenida Paulista - símbolo da antiga opulência - e agora deixa as colunas sociais para entrar nas páginas policiais. No domingo 21, tornaram-se públicas acusações feitas por um ex-segurança dos Matarazzo, Sérgio Ricardo Vernizzi. Ele afirma que José Carlos Matarazzo Kalil, bisneto do conde Francisco Matarazzo, pioneiro da industrialização em São Paulo, participou em março de 1993 do sequestro e morte de Antônio Erivan de Oliveira Motta. Ainda segundo as denúncias, a empresária Maria Pia Matarazzo, mãe de José Carlos, teria orquestrado a ocultação do cadáver de Motta, encontrado parcialmente carbonizado, em 1º de abril de 1993. "Isso é extorsão contra os Matarazzo", diz o advogado de Maria Pia, Márcio Thomaz Bastos. 

A história está cheia de interrogações e desde a quarta-feira 24 a polícia de São Paulo determinou o sigilo das investigações. A forma como a polícia tomou conhecimento das denúncias, contudo, pesa a favor dos Matarazzo. Conhecido alcagüete, desses que frequentam as portas de delegacias e sobrevivem da venda de informações sobre pequenos marginais, Vernizzi não procurou a polícia para fazer suas acusações. Em novembro do ano passado, ele foi preso em flagrante quando tentava extorquir R$ 400 de um motoqueiro, após apresentar-se como policial. Depois da prisão, a polícia encontrou no porta-luvas de seu carro uma fita cassete onde o próprio ex-segurança narra as acusações contra os Matarazzo. Chamado a depor na Delegacia de Homicídios, Vernizzi confirmou o conteúdo da fita e desapareceu. Os Matarazzo têm ainda uma carta na manga do colete para tentar comprovar a tese da extorsão. Segundo amigos da família, quando for depor, Maria Pia levará à polícia uma cópia da fita gravada por Vernizzi. Esta cópia teria sido remetida a ela há cerca de um ano, época em que o ex-segurança teria feito diversas ligações pedindo dinheiro para não entregar a gravação original à Secretaria de Segurança Pública. 

Por outro lado, contra os Matarazzo também existem alguns fatos. José Carlos não tem exatamente o perfil de um santo. Aos 27 anos, ele responde a cinco inquéritos policiais, todos por estelionato. A polícia entende, porém, que os indícios mais concretos de que a história contada por Vernizzi possa ter alguma veracidade estão nos detalhes da própria história. As denúncias começam com o sequestro de Darci de Moraes, cunhada do milionário da soja Olacyr de Moraes e ex-sogra de José Carlos, ocorrido em janeiro de 1993. Descoberto o cativeiro, ela foi libertada em 7 de fevereiro, mas os sequestradores não foram presos. Segundo Vernizzi, José Carlos teria se juntado a alguns policiais para desmantelar a quadrilha. Em 26 de março de 1993, eles teriam raptado Erivan Motta, um microempresário com várias passagens na polícia, suspeito de ter participado do sequestro. Baleado na perna, Motta teria sido levado até a fazenda Invernada do Sertão, de Maria Pia, em Campinas (SP). Depois de ser torturado até a morte, o microempresário teria sido enterrado pelo grupo. Três dias depois, Maria Pia teria sabido da história. Acompanhada de sua filha Maria Ângela, do médico da família, Bernardino Tranchesi Júnior, e de dois seguranças - o próprio Vernizzi e Roy dos Santos Batista -, Maria Pia teria determinado a ocultação do cadáver. O corpo de Motta, então, teria sido desenterrado e levado para uma estrada vicinal, próxima de Jundiaí (SP). Vernizzi teria regado com gasolina o cadáver, envolto em mantas de forração de carro e sacos plásticos, e ateado fogo. Em 1º de abril, o corpo foi encontrado e identificado. Como não havia nenhum indício que levasse ao assassino, o caso foi arquivado no final de 1995. 

De fato, o corpo de Motta apresentava um ferimento a bala na perna. Junto ao cadáver havia um saco plástico da empresa Terracota, situada nas vizinhanças da fazenda de Maria Pia. A polícia encontrou manchas de sangue no sofá do escritório de Motta, onde de acordo com Vernizzi o microempresário foi baleado. "Temos muito a investigar", diz o delegado Fernando Quibao, responsável pelo caso. 

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

O fim do Império dos Matarazzo


Quase nada restou do império construído por Francisco Matarazzo. Após sua morte, a condução dos negócios foi entregue ao décimo-segundo de seus treze filhos, Francisco Matarazzo Júnior . Mais conhecido como o Conde Chiquinho, ele ficou famoso pela festa nababesca que promoveu para celebrar o casamento da filha Filomena, em 1945. Seus problemas começaram na década de 50, com o avanço da industrialização e o aumento da concorrência ao redor dos negócios da família. Endividadas, as empresas foram vendidas uma a uma, em meio a várias brigas na família, até a concordata no início dos anos 80. Maria Pia, a filha predileta de Chiquinho, apagou a luz.

A vida de FRANCISCO MATARAZZO


Houve um momento em que os negócios do conde Francisco Matarazzo (1854-1937) no Brasil tinham se diversificado tanto que até ele parecia confuso. “Sou comerciante de farinha, de bacalhau, de algodão... Não entendo de mais nada”, brincou certa vez. Não era à toa. Nas cinco décadas que levou para erguer seu império industrial, Matarazzo pôs o dedo numa variedade de empreendimentos e atividades impressionante até para os dias de hoje. Dizia-se em seu tempo que o conde tinha 365 fábricas, uma para cada dia do ano, e é bem possível que isso tenha sido verdade. No auge, as Indústrias Reunidas F. Matarazzo produziam tecidos, latas, óleos comestíveis, açúcar, sabão, presunto, pregos, velas, louças, azulejos. Matarazzo tinha um banco, uma frota particular de navios, um terminal exclusivo no porto de Santos e duas locomotivas para transportar mercadorias no pátio da sede do complexo industrial, em São Paulo. Quando o conde fez 80 anos, suas empresas faturavam 350 mil contos de réis por ano, dinheiro equivalente na época à arrecadação de São Paulo, o Estado mais rico da Federação. Se a conta fosse feita hoje, nenhum dos conglomerados nacionais conseguiria bater Matarazzo.

Ele não foi apenas um pioneiro da industrialização. Matarazzo foi um dos primeiros empresários a se voltar prioritariamente para o mercado interno, numa época em que a economia brasileira era dominada pela exportação de café. Matarazzo descobria consumidores onde ninguém mais enxergava oportunidades de negócio. Ele achava possível ganhar dinheiro produzindo mercadorias que a maioria dos brasileiros consumia aqui mesmo, no dia-a-dia. Arroz, vinho, queijo, quase tudo que aparecia na mesa dos brasileiros era importado na virada do século. Matarazzo foi dos primeiros a enriquecer produzindo esse tipo de coisa no Brasil. Foi assim desde 1881, quando ele chegou da Itália e abriu uma venda em Sorocaba, no interior paulista. A maior parte das mercadorias que expunha nas prateleiras era importada. A primeira que ele começou a produzir aqui foi a banha de porco, que era importada dos Estados Unidos e as pessoas usavam para cozinhar e conservar alimentos. Matarazzo escolhia seus porcos pessoalmente em viagens pelo interior e vendia a banha em barris de madeira que levava à freguesia de porta em porta.

Matarazzo levantou seu império aos poucos. Mudou-se para São Paulo dez anos depois de chegar ao Brasil e só inaugurou a primeira fábrica, um moinho de trigo, uma década mais tarde, em 1900. O sucesso de sua trajetória é uma mistura de esperteza e oportunidade. Como importador, Matarazzo tinha uma visão privilegiada da paisagem econômica. Conhecia os preços das mercadorias e os interesses dos consumidores, tinha acesso a crédito e relações com uma rede de pequenos revendedores. Com tanta informação, ele conseguia saber a hora certa de reduzir as importações de um determinado produto e começar a produzi-lo aqui. Além disso, Matarazzo tinha dinheiro para investir. Especulava com o câmbio e lucrava com o banco, que monopolizava a remessa das economias que os imigrantes italianos despachavam para a terra natal. Como outros pioneiros da industrialização brasileira, ele também teve uma bela ajuda do governo, cuja política de proteção alfandegária reduzia o custo de importação de algumas matérias-primas e impunha tarifas elevadas a produtos estrangeiros que poderiam competir com os nacionais.

As grandes fortunas do início do século foram cevadas nas fazendas de café. Seus proprietários davam as cartas nos negócios, na política e no governo. Matarazzo não fez feio nesse ambiente. Um dos homens mais ricos de seu tempo, tinha mansão na Avenida Paulista e ia para o trabalho de limusine, mas sempre foi visto como uma espécie de novo-rico pela elite da época. O título de conde, recebeu do imperador Vitorio Emmanuele por ter enviado à Itália mantimentos durante a Primeira Guerra Mundial. Matarazzo tinha admiração por Benito Mussolini, a ponto de contribuir com o fascismo financeiramente, e era um sujeito popular entre os italianos que viviam no Brasil. A maioria dos operários em suas fábricas era formada por italianos, e eram feitos em italiano os discursos do patrão aos empregados. Fora da colônia, Matarazzo era visto com desconfiança pelos fazendeiros e pela nascente classe média urbana, e o comportamento da família só fez a antipatia crescer depois de sua morte. Com o velho conde fora de cena, seu império começava a ruir.

IRFM - Indústrias Reunidas Francesco Matarazzo

Dá para imaginar a cena de uma típica família paulistana da década de 20. Na mesa do café da manhã, a banha enlatada, o açúcar e o presunto cozido servidos pela dona de casa ao marido e à numerosa prole tinham no rótulo um só emblema: "IRFM - Indústrias Reunidas Francesco Matarazzo." Na prateleira da cozinha, ela guardava amido Brilhante, arroz Iguape, azeite para saladas Sol Levante "o preferido pela sua pureza", lixívia São Jorge "sem rival para limpar cristais e panelas" e Licor Brasil, todos produzidos pelo imigrante italiano Francesco Matarazzo. Na estante do banheiro, um vidro de água de colônia Mimi, o sabonete Rex "que deixa sua pele acetinada" e ainda um frasco de perfume Sedução. 

Onipresente
Enfeitava a cama do casal a colcha Princeza, que a dona de casa só lavava com sabão de coco "destinado para tecidos finos". A família usava roupas feitas com cortes da tecelagem Mariângela, uma das 365 fábricas que formavam o império das IRFM. À noite, as velas acendidas na casa eram da marca Progresso e o jantar era sucedido de uma dose de conhaque de gengibre Matarazzo. A onipresença da marca do imigrante no dia-a-dia dos brasileiros dá bem a idéia de seu poderio econômico. Nos anos 30, a renda bruta do conglomerado era a quarta maior do Brasil. Faturavam mais que Matarazzo apenas a União Federal, o Departamento Nacional do Café e o Estado de São Paulo.

Se desejássemos dar uma pincelada ainda maior de realidade ao nosso exercício de imaginação, poderíamos situar esta família de consumidores da marca Matarazzo no Brás, bairro paulistano nascido justamente para abrigar os trabalhadores das IRFM. Havia pelo menos sete mil lares que, nos anos 20, dependiam dos salários do industrial. Considerando que cada um de seus empregados tinha mais quatro bocas para sustentar, chegaram a depender de Matarazzo cerca de 35 mil pessoas, nada menos que 6% da população da capital paulista na época.

Com quase 1,90 metro de altura, Francesco Matarazzo era daqueles homens de elegância nata. Ficava bem em qualquer roupa que vestisse, mas durante a vida usou poucas coisas que não fossem ternos impecáveis. A fisionomia era típica dos homens do sul da Itália (nasceu em Castellabate, a 9 de março de 1854) e a calvície e o bigode sempre alinhado eram marcas registradas. Além do porte físico que lhe beneficiava - era difícil não se resignar diante de homem tão altivo -, impunha respeito com pouquíssimas palavras. Ninguém acreditava quando dizia que só concluiu o ensino fundamental. O pai morreu quando ele tinha 18 anos e, sendo o primogênito, abandonou os estudos para sustentar a família. No Brasil, encarnou a figura do "imigrante que deu certo", transformou-se num mito e foi idolatrado pela colônia italiana, à qual defendia com unhas e dentes.

No entanto, ao desembarcar no Rio de Janeiro, em 1881, tinha tudo para se desesperar. A tonelada de banha de porco que trazia da terra natal para comercializar aqui afundou com a embarcação que levava a carga do navio, por puro azar, pouco antes de aportar no Brasil. Sem perspectivas e com pouco dinheiro no bolso, a única esperança de se manter vivo era encontrar um velho amigo e conterrâneo, Fernando Gradino, que vivia em Sorocaba (SP). Meses depois escreveu para a família que deixara na Itália - a mãe Mariângela, a esposa Filomena, oito irmãos e dois filhos: "Abri uma venda em Sorocaba e não procurei, nem jamais procurarei, ter o que se chama de patrão." Empréstimos ajudaram-no a abrir o pequeno empreendimento. Na mercearia, as estantes viviam abarrotadas de produtos de todos os tipos - ele cismava em importar tudo o que aparecesse. Se a clientela pedisse alguma coisa que ele não tinha, tratava de arrumar mais que depressa. Por ironia, o campeão de vendas era a banha de porco importada, o mesmo produto que ele trouxera da Itália e repousava no fundo do mar. Era ingrediente de primeira necessidade para a conserva de alimentos.

"Ele não estava morrendo de fome na Itália. A idéia de tentar a sorte demonstra que tinha um temperamento inquieto e visionário", disse a ISTOÉ Andrea Matarazzo, atual secretário de Comunicação Social da Presidência da República e sobrinho-bisneto do imigrante. "Veio obstinado com a idéia de ganhar dinheiro e estava à frente de seu tempo." Na rabeira do sucesso de vendas da banha em seu armazém, decidiu fabricar o produto, já que porcos não faltavam. O método era simples: bastava um caldeirão no fundo do quintal para derreter a banha. "O segredo está na compra e não na venda", dizia o comerciante aos amigos, com a propriedade de quem sabia negociar no atacado como ninguém. Comprou quase todos os porcos da região e, além de baratear a produção, também revendia o animal. No início, entregava pessoalmente os barris, que eram devolvidos e repostos após a utilização. Mais tarde, veio a grande sacada: enlatar o produto.

Intuição aguçada
O negócio prosperou e, em 1890, suas pretensões já não ca-biam mais em Sorocaba. Quando partiu para a capital paulista, já tinha mandado buscar a esposa, os filhos e três irmãos - Guiseppe, Luigi e Andrea - em Castellabate. A intuição aguçada de bom empreendedor não lhe abandonava nunca. Quando a farinha de trigo faltou no País, Matarazzo não pensou duas vezes. Foi pedir ajuda ao London and Brazilian Bank para construir um moinho, em São Paulo, e seu faturamento cresceu absurdamente. Em 1887, a cifra chegava a 20 contos de réis, e em 1900, possuía 2.020 contos - um crescimento de 9.950% em 13 anos. Em 1920, ergueu o primeiro grande parque industrial do Brasil, na Água Branca, zona oeste de São Paulo. Numa área de 100 mil metros quadrados, reuniu serraria, refinaria, destilaria, frigorífico, fábrica de carroças, de sabões, perfumes, adubos e inseticidas, velas, pregos e outra dezena de indústrias, que funcionavam com a energia de uma usina própria. Nos anos 30, abriu filiais em Ponta Grossa (PR), João Pessoa, Rio de Janeiro, Santos e Curitiba.

Dizendo que o povo de sua terra possuía "inigualáveis força e capacidade de produção", nove entre dez trabalhadores que contratava eram de origem italiana. Ele próprio tratava de provar a tese. Por mais de 30 anos, foi o primeiro a chegar, às sete horas, e o último a sair da fábrica, 14 horas depois. "Era rígido e tinha comportamento exemplar para os funcionários. Considerava-se o operário número um", diz Andrea. Com muito sacrifício, a esposa Filomena conseguia impedi-lo de sair às cinco para pegar no batente, argumentando que nem só de trabalho vive o homem. Reza a lenda que, quase octogenário, numa de suas visitas diárias às indústrias, o velho ouviu de um operário a reclamação de que uma ferramenta qualquer estava inutilizada. Matarazzo resolveu: "Deve haver outra igual a esta, em estado melhor, naquele armário ali." O funcionário, duvidando que o chefe conhecesse tanto assim os milhões de armários de suas fábricas, foi conferir. E encontrou a peça. Matarazzo tinha uma só explicação para a proeza: "Intuição." Quem não sabe o que é dirigir um imenso complexo industrial e milhares de funcionários durante quase três décadas que duvide.

Se como administrador era um exemplo de sociabilidade - perdia tempo proseando com os empregados e tinha sempre uma história para contar nas reuniões de diretoria -, como chefe de família não se pode dizer a mesma coisa. Austero e pouco afável com os 13 filhos, fazia questão de manter a ordem em casa. A educação vinha em primeiro lugar e ai de quem ousasse desobedecer o patriarca.

Mas o carisma não se deixava ofuscar pela eterna braveza. Símbolo da elite industrial paulista, Matarazzo liderou os empresários das primeiras décadas deste século. Em 1928, fundou o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), do qual foi o primeiro presidente. No entanto, nunca concorreu a cargos eletivos - detestava discursar. Nas poucas vezes em que falou em público, o fez em italiano, mesmo porque nunca quis dominar o nosso idioma. A ligação com a Itália era muito maior do que a língua. "Ele teve dois amores na vida: a pátria onde nasceu e as Indústrias Matarazzo", disse Jorge da Cunha Lima, presidente da Fundação Padre Anchieta e autor do livro Matarazzo 100 anos. "Foi por causa da paixão pela Itália que recebeu o título de Conde." Durante a Primeira Guerra Mundial, o industrial mudou-se para o país de origem, onde foi ajudar no abastecimento das cidades mais atingidas. Pelos serviços prestados à nação, recebeu o título, embora a família, cuja tradição remonta ao século XII, carregue a nobreza no sangue.

Acertando os ponteiros 
Se o sangue azul não o fazia sentir-se orgulhoso, também não o incomodava. Homem de poucas ostentações, sua única veleidade era a paixão por carros. Há quem jure que o primeiro Ford a circular na capital paulista foi o dele, que parava multidões quando circulava. Mas não surpreendia ninguém, porque o rigor dos horários do Conde fazia com que os populares soubessem exatamente quando e onde ele iria passar. A rotina era tão metódica que alfaiates, barbeiros, sapateiros e comerciantes em geral acertavam os ponteiros de seus relógios de acordo com as passagens do velho. Figura folclórica na cidade, foi personagem da célebre frase "Pensa que eu sou o Matarazzo?", resposta comum que os chefes de família davam às esposas quando os gastos passavam dos limites. Pudera, a mansão na Avenida Paulista estava lá, imponente, numa área de 12 mil metros quadrados, para quem quisesse ver. No portão principal, o brasão da família intimidava qualquer um que passasse em frente. A casa foi demolida nos anos 80 e parte do terreno hoje abriga um estacionamento.

Ruína 
Antes dela ruíra a maioria das indústrias do patriarca. Os sucessores do Conde, o filho Francisco Júnior e a neta Maria Pia, não suportaram a concorrência que chegou com os anos 50. "A falha foi não ter percebido a mudança no cenário industrial. Era preciso se especializar. De que adiantava fabricar uma imensa variedade de produtos sem liderar as vendas de nenhum?", analisa Cunha Lima. Menos mal que o Conde não viveu para assistir à bancarrota. Morreu a 10 de dezembro de 1937, aos 83 anos, de uma crise de uremia (bloqueio repentino da circulação do sangue). Tinha o hábito de visitar diariamente pelo menos uma empresa de seu império. E só não conversava com todos os funcionários porque era tarefa impossível - o exército de trabalhadores era formado por 15 mil homens, em 365 fábricas, uma para cada dia do ano. Os operários, numa homenagem ao chefe, acompanharam o cortejo com uma faixa na lapela onde se lia: "Vida eterna ao Conde."

VOCÊ SABIA?
Doou um terreno para a construção do Parque Antártica, o estádio do Palestra Itália, hoje Palmeiras, que era seu time de coração.

VOCÊ SABIA?
Era fã de Mussolini e teve até dois encontros com o ditador italiano, além de doar gordas quantias aos fascistas brasileiros.brasileiros